tons de verde não me acalmam

10 de novembro de 2014

Tons de verde não me acalmam. Muito menos se desprendem da inevitável ciência de ser partícula receptora de loucuras cósmicas. Me inspiro. Acendo um. Deito uma cerveja de alto teor alcoólico. São onze da manhã e não tem nada melhor do que enlouquecer com apenas um copo americano de power coffe no estômago. Sorry meu querido e inestimável órgão interno, mas hoje vou dar prioridade para outros tipos de voos e você vai segurar essa onda bicho.
Estou de frente pro mato. Mata ciliar que cerca o pequeno ribeirão do bairro do Passa Três. Me organizo no meio de uma clareira para observar a natureza local que de uns tempos pra cá, voltou a ser exuberante. Em meio a tantos pássaros exóticos: Saíras amarelos, sanhaços azuis, verdes, cinzas, gaturamas, pintassilgos. Quem rouba a cena é um filhote de pardal. Ele está aprendendo a voar. Não para de cantar por um segundo sequer. Se arrisca em pequenos saltos e totalmente sem noção voa atrás de curruíras, tico-ticos e sanhaços pedindo comida. Com essa gritaria louca no meio da mata o bichinho é presa fácil.
O pardal pai é o primeiro a aparecer. Alimenta o pardalzinho por um bom tempo e some em seguida … a pardal mãe chega na sequência e fica um pouco com o filhote que arrisca um voo mais ousado e quase é pego por uma águia de rapina, interceptada, vejam só, pelos sanhaços azuis. Salvo do ataque, o pequeno pardal se esconde num arbusto baixo e passa o resto de tempo por lá. Continua gritando, mas dessa vez no meio dos arbustos.
A natureza é sensacional. Observo o vai e vem das mamangabas enormes que voam no estilo helicóptero visitando as flores baixas da pequena floresta. Borboletas brancas e amarelas alternam as mesmas flores. São dezenas, centenas de borboletas de várias espécies, abelhas silvestres, vespas, pequenas moscas. Fixo o olhar nesse universo que antecede o salto dos pássaros e estou a mercê do deslumbrante universo dos insetos.
Alto das ideias me volto para dentro e começo a confabular com as minhas entidades interiores, que são muitas e intensas. Melodias brotam a todo instante. Mas o dia é de conectar com os caras da escrita. Antes de deitar a primeira cerva do dia, li boa parte do livro ‘Cartas da Rua’, do mister Bukowiski, tô lendo esse livro pela segunda vez. Ler um livro duas vezes pode ser uma experiência excitante ou decepcionante. O velho Buko, meu caro, jamais decepciona, se torna melhor a cada lida.
Deito mais uma cerveja quente. Acendo a ponta. Agora meu corpo se manifesta. Começo a conversar com ele. Os dedos do pé reclamam da bota, as palmas também. Eles querem sentir o mato. Querem pisar na mata. Tiro as botas e as meias. Nos últimos anos voltei a correr e a andar muito a pé. Passei a dividir muitas histórias e confidências com eles, maiores companheiros de estrada. Dadas as corridas matinais. Endorfina vez ou outra. Viagem das boas. Minha mente divaga até o momento que um bando de saguis aparecem perto de uma pequena amoreira.
Um bando, mais de dez com certeza. Eles chegam assobiando e fazendo umas caretas pra mim. Um assovio fino e forte. FIU! FIU! Um canto um tanto quanto enigmático, com aquela ancestralidade que bate no entes internos.
Miro a paisagem, não faço mais parte dela nessa existência, mas estou lá sentado, invadindo o espaço dos saguis, conectando a ancestralidade por uma manhã. Um dia virarei pedra novamente … e habitarei o interior do planeta. Bem lá dentro. Bem no núcleo. Fogo. Que é pra onde nós vamos quando deixamos o corpo que no final de tudo mesmo, vira cinzas, vira lava, vira ar, vira larva, vira água, vira pedra. Vai pro céu e pro centro. Vai pra tudo quanto é canto.
Os saguis estão me intimando mesmo. FIU! FIU! Estou na área deles. O que eu posso dizer é que passei minha infância inteira nesse local e não vi um deles. Agora eles voltaram nessa pequena faixa de mata que um dia foi embora e de uns anos pra cá voltou. Dá um frio na barriga encontrar eles pela primeira vez. Era um sonho de infância ver os macacos no sítio.
Olho para o mesmo ribeirão em que pesquei em Janeiro desse ano e ele está praticamente vazio, um pequeno filete de água. Durante toda a minha infância, jamais presenciei ele seco dessa maneira. Divago e peço as entidades que não falte água para os bichos, insetos e pássaros da mata. A humanidade anda por onde? Começo acreditar na não existência.

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